Trabalhar: prazer ou punição? Por que é tão difícil trabalhar?

escrita que cura trabalho charles chaplin

Entreguei a chave e o cartão ao manobrista e ele, titubeando, perguntou ao companheiro:

– Você pega o carro dela?

– Eu, não. Ainda tô em horário de almoço e não vou trabalhar nem um minuto de graça.

Fiquei perplexa! Não porque ele não estivesse disposto a trazer o carro dessa que vos escreve. Mas, sim, pela preguiça e má vontade. Pela falta de gentileza. Pela dificuldade do rapaz em pensar além do aqui e agora…

A palavra trabalho vem do latim “Tripallium”, instrumento de tortura usado na Idade Média. Muitos ainda enxergam o trabalho dessa maneira, uma obrigação insuportável a ser cumprida, enquanto a vida acontece. Por isso, ficam esperando a sexta-feira, as férias, os feriados, os fins de semana, quando, então, poderão ser felizes. E flanam pela vida, superficial e ansiosamente, de segunda a quinta. No domingo, voltam a sofrer e a musiquinha do Fantástico, geralmente decreta a morte da Liberdade.    
 
Mas…Será que precisa ser assim? Não haverá nada de atrativo no ato de trabalhar e na função exercida? Nada que alimente a alma, ainda que a atividade seja a de bater carimbos, limpar o chão ou manobrar os carros? Ou, se o sacrifício for tão grande assim, por que algumas pessoas se acomodam naquilo que as faz infelizes? Não vou entrar na questão da dificuldade de emprego, na recessão econômica, nas leis perversas da organização do trabalho e na falta de oportunidades para a sociedade em geral. Quero estimular a reflexão daqueles que vivem se queixando e esmorecem, à simples possibilidade de mudar sua vida ocupacional. 
Existem pessoas que passam anos em empregos que odeiam, sendo assediados moralmente por chefes perversos e, mesmo assim, não tomam providências,  esperando que a aposentadoria traga a felicidade.

Ninguém é obrigado a trabalhar de graça.  Isso é escravidão e sobre esse tema nosso país foi mestre durante anos. Escravidão ainda existe, de forma explícita e disfarçada, em vários pontos do planeta e as manchetes dos jornais apontam para o fato, de vez em quando. As pessoas de boa índole a querem extinta. Mas, a eficiência do profissional – seja ele de que área for – sua presteza, educação, astúcia e simpatia, são pontos a se considerar e a conquistar o cliente, que, grato, tenderá a recompensá-lo.

No estacionamento ​que citei ​havia um rapaz correto,  sério e produtivo. Avisei-lhe, logo no começo, que tinha um horário diferenciado e ​uma vida ​tomad​a ​por inúmeros compromissos ao longo do dia. Portanto, precisava do carro tão logo chegasse. Perguntei – lhe se  achava possível agilizar o processo. Só precisei pedir uma vez. Todos os dias, eu mal apontava e ele já trazia o carro. Passei a lhe dar uma gorjeta toda sexta-feira e a lhe levar presentes, de vez em quando. Como trabalhava bem demais, os colegas se acostumaram e passaram a fazer corpo mole. Sobrava tudo pra ele. Foi punido com excesso de trabalho porque levava sua função a sério. Até que encheu-se.  Pediu demissão. Disse-lhe para deixar o email e o telefone, pois acreditava que não ficaria desempregado por muito tempo. Pouco  depois, meu marido arrumou – lhe um emprego com uma amiga, proprietária de outro estacionamento.  Não sei se ele continua por lá, mas é o tipo de pessoa que não tem medo de botar a mão na massa  e sabe que precisa ganhar o pão com dignidade.

O que quero dizer, com todo esse discurso, é que sua função não requeria muita astúcia nem estratégias para desempenhá-la. Mas, mesmo sendo um trabalho bastante automatizado e corriqueiro, ele conseguia imprimir uma qualidade inigualável no desempenho do mesmo. Isso era dele! Suas qualidades pessoais e profissionais estavam marcadas naquilo que ele fazia, porque estavam gravadas no seu jeito de ser.​

​ Mas…o que fazer, quando não se tem esse diferencial? Como resolver essa questão? Em primeiro lugar, é preciso desejar mudar. Depois fazer uma lista do que incomoda no trabalho e pensar, seriamente, se há possibilidade de mudança. Em caso afirmativo,  tentar implementar ações práticas a partir de um planejamento. E avaliar, sempre, os resultados. Fácil? Nada é fácil na vida. Iludido está quem pensa assim. Mas, o que não dá é sermos torturados diariamente como se ainda vivêssemos na Idade Média. Afinal de contas, tinha razão Freud quando disse: “O homem normal é aquele capaz de amar e TRABALHAR”.

escrita

Website:

2 Comentários

  1. Leo

    Em nosso cotidiano vivemos encontrando pessoas que não gostam do que fazem. O fazem pela oportunidade que aconteceu. Não correm atrás do que as realizam.

    • escrita

      E, com isso, Leo, vivem infelizes, pesados, amargurados. O trabalho pode adoecer mas pode, também, contribuir – e muito! – para a saúde mental. Abraços.

Deixe uma resposta para escrita Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *